Nossa consciência emocional e o impacto nas crianças

Quando crianças somos espelhos dos adultos. E neles, também nos espelhamos. Crescemos imitando os adultos em nossa volta de forma a refletir seus comportamentos e também nos baseamos neles para continuarmos crescendo e aprendendo via seus exemplos. Mas o que acontece quando nós – os adultos – não sabemos lidar com o conteúdo emocional que nós temos? Que exemplo passamos para nossas crianças neste momento?

O ator da série Mad Men, John Hamm, tinha 10 anos quando sua mãe faleceu por um câncer de cólon. John conta numa entrevista a David Tennant o impacto que foi ver sua mãe perdendo rapidamente sua saúde, da dureza desta fase. O que me chamou a atenção em seu depoimento foi o relato de que o que mais assustou e o deixou desconfortável foi a visão de todos os adultos ficando instáveis com a morte e se desequilibrando. Isso o impactou bastante pois estava acostumado a ver os adultos como as pessoas que “resolvem as coisas” e mantém a linha. Ver todas as pessoas chorando, inclusive seu avô que era um veterano de guerra, deixou uma impressão bem forte no ator.

A vulnerabilidade demonstrada pelos adultos na época deveria ser algo natural e aceita. Mas a criação de uma imagem equivocada – de uma retidão emocional e inabalável por parte dos adultos da época para blindar a criança das adversidades da vida, não ajudou muito quando esta máscara caiu para a criança. Ele tomou conhecimento, neste momento, que muitos adultos também não sabem lidar com as suas próprias emoções.

É sempre um dilema para os adultos decidirem o que podem compartilhar com crianças e como. Essa história mostra que tentar passar uma imagem de que tudo está sempre bem e que você é capaz de resolver qualquer problema pode ser danosa quando você finalmente colapsa. Quando crianças, é normal vivermos num mundo em que realidade e fantasia se misturam. O mundo é mágico para a criança e deve ser, para o seu correto desenvolvimento. Estamos na fase do “papai sabe tudo” ou “meus pais são super heróis”. Mas será que isso isso significa privar a criança de todas as coisas ruins que ocorrem na vida? Como manter o equilíbrio, para que a criança possa ter forças quando algo inescapável como a morte chega perto?

O fato dela viver numa ilusão, onde os adultos aparentemente não tinham problemas emocionais, não choravam, e sempre sabiam como resolver suas questões criou uma falsa ideia sobre o que é ser adulto, que potencialmente gerou uma dificuldade na criança de confiança vendo que seu entorno desmoronou e os adultos estavam, na verdade, mentindo ou escondendo algo dele.

O melhor caminho fosse talvez mostrar que a dor é comum e que todos compartilham destes sentimentos, desde sempre. Isso pode ajudar a criança a entender e expressar de forma segura seus próprios medos e inseguranças.  Mostrar empatia ao sofrimento de todos pode melhorar a nossa resiliência, não se criando uma falsa esfera de proteção que além de irreal acaba separando as crianças num momento em que não faz sentido manter uma farsa, de que todos os adultos são auto-suficientes e inabaláveis.

Na biografia de John Hamm, não ter acesso a adultos saudáveis emocionalmente provou ter consequências negativas no longo prazo. Ele viu seus pais se divorciarem com 2 anos, perdeu a mãe aos 10 anos, e seu pai também aos 20 anos de idade. Ele conta que  – embora não tivesse consciência disso na época – o luto que começou aos 10 anos de idade levou praticamente 20 anos a mais para que fosse digerido pelo ator e tem reflexos até hoje, em seu medo de abandono e outras fobias e comportamentos. Alguns anos atrás o ator entrou para uma clínica de reabilitação para tratar seu alcoolismo.

Compartilhar ou explicar assuntos delicados para crianças não significa que elas devam resolver problemas de adultos. E certos assuntos sensíveis são realmente um desafio para explicar e põe à mostra nossa própria estrutura emocional. John conta como tentaram falar sobre a morte de sua mãe com um livro sobre a morte de pais, por exemplo. Isto não significa que o melhor caminho é esconder da criança que existe dor e sofrimento no mundo adulto, pelo contrário. São em momentos desafiadores como este, em que temos que lidar com nossos próprios medos e sombras que temos a oportunidade de ensinar de uma maneira sincera para uma criança o que é ser humano.

Você tem alguma memória de um momento similar em que percebeu uma diferença entre o que os adultos falavam e como se comportavam? Comente abaixo!

Referências

7 coisas que ninguém conta sobre perder os pais na infância

Biografia de John Hamm

Entrevista em podcast de John Hamm por David Tenant

Quando seu pai ou sua mãe morrem (livro)

John Hamm fala sobre a morte de seus pais

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