A fuga de nosso destino – O Complexo de Jonas

O Psicólogo americano Abraham Harold Maslow cunhou a expressão Complexo de Jonas para descrever a fuga do próprio sucesso – ou propósito maior de vida. Seria, junto com a dessacralização – assunto para outro artigo – dois dos mecanismos de defesa que o ego utiliza e que bloqueiam ao mesmo tempo nosso desenvolvimento em direção ao nosso potencial pleno.

Na parábola Jonas é convocado por Deus para pregar em uma cidade que o desagradava. Jonas deveria pregar para avisar que ela seria destruída pela ira de Deus. Ao invés disso, Jonas decide fugir na direção oposta, e embarca num navio para outra cidade. Deus envia uma grande tempestade que atinge o navio quase causando um naufrágio. Os marinheiros rezam para seus deuses, mas nada adianta. Pedem então para Jonas rezar para seu Deus, mas ele sabe que é culpado pelo infortúnio que aflige a embarcação. Os marinheiros não sabem mais o que fazer, e perguntando a ele que atitude tomar, Jonas diz: Joguem-me ao mar para aplacar ao meu Deus. Ao fazerem isso,a tempestade passa, e Jonas é engolido por uma baleia, enviado por Deus. Dentro dela, ora e suplica por 3 dias, até que ela o devolve à praia. Jonas então retoma para a cidade para fazer a pregação que havia se negado da primeira vez. A história completa você pode ler aqui.

Pieter Lastman – Jonas e a Baleia

A história é muito interessante por várias nuances. A fuga de seu destino, ou propósito; A culpa e a punição por estar fora de nosso destino; O sacrifício pela fatalidade causada;  O arrependimento e a redenção.

“O indivíduo se defronta a todo instante ao longo da vida quando deve optar entre os prazeres de segurança e do crescimento, dependência e independência, regressão e progresso, imaturidade e maturidade”.


Abraham Harold Maslow

Para ele, segundo Vera Saldanha, “O desenvolvimento da personalidade humana ocorre a partir de uma necessidade, motivo ou impulso soberano, com uma tendência inerente ao crescimento e autoperfeição”. Fugir de nosso destino, neste caso, causaria uma série de problemas psicológicos, de depressão a neuroses, pois nós bloqueamos o fluir da nossa vida em sua direção à plenitude.

Para Maslow temos dentro de nós as forças e a vontade inata para o autodesenvolvimento e a transcendência. Neste ponto, ele difere sutilmente de Freud e a ideia da libido como força motriz, e se aproxima mais de Jung, e sua ideia de vontade, de uma forma positiva. Era um crítico e um entusiasta da psicanálise clássica, ao apontar que muitos pesquisadores, antropólogos e sociólogos apontavam sempre as motivações inferiores, ligadas a coisas materiais e instintos de sobrevivência, e não as motivações superiores, como a ideia de sagrado, preceitos morais, que para ele são constituinte da natureza humana.

Dentro da Psicologia Humanista, O Complexo de Jonas ocorre sempre que nos defrontamos com uma oportunidade natural de desenvolvimento, mas que é impedida por um sistema complexo de bloqueios internos de nossa psiquê. Isso ocorre como um mecanismo de defesa, que é criado em momentos traumáticos em nossa história – seja ela biográfica ou mesmo hereditária.

Um exemplo seria se Ally, protagonizada por Lady Gaga em A Star is Born ao subir no palco para acompanhar Jackson, decidisse não ir cantar quando chamada, e congelasse de medo. Um outro exemplo seria quando Luke Skywalker, em um primeiro momento, quer ir à luta contra o Império, mas decide voltar para casa e foge do chamado no primeiro Star Wars. Só retorna quando percebe que seus tios foram mortos pelo mesmo Império Galático. Até mesmo o Homem Aranha, ao ser chamado para ir lutar na Alemanha, por Tony Stark no Filme Capitão América: Guerra Civil, tem como resposta imediata “Não posso, tenho dever de casa para fazer’. Todos acabam indo no final – afinal o filme tem que acontecer – e qual é a graça de filmar duas horas Peter Parker resolvendo álgebra para o colégio?

Maslow costumava perguntar aos seus alunos de psicologia: “Quem aqui vai escrever uma grande obra de psicologia?”, “Quem quer ser um senador, um governador, um presidente?” E frente as risadas nervosas de seus alunos, retrucava: “Se não vocês, quem?” “Por acaso almeja ser um psicólogo medíocre?” “Se vocês psicólogos não forem escrever os grandes livros de Psicologia, quem escreverá?”.

E como alterar este padrão, e retomar o caminho do crescimento?

É necessário reconhecer em que momentos o Complexo é ativado, e quais são as respostas emocionais e fisiológicas, de forma a identificar claramente o padrão e conseguir criar um ponto onde será possível explorar os eventos que levaram a este comportamento. Atualmente o trabalho terapêutico em diversas áreas é focado mais em nossas potencialidades, e não tanto em nossas neuroses, com o desenvolvimento da Psicologia Positivista, por exemplo. Várias terapias integrativas trabalham especialmente com crenças limitantes de forma a desbloquear padrões de comportamento, como Psych-K, ThetaHealing, Barras de Access, Respiração Bioflow, entre outras. O trabalho de coaching pode ajudar também a identificar barreiras em sua profissão e lhe ajudar a crescer na direção desejada.

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Um bom caminho é fazer um trabalho de identificação de crenças limitantes. Você pode, por exemplo, anotar ditados e pensamentos que costuma usar e se identifica e que podem ter uma conotação negativa em sua vida. Pensamentos como “Nunca serei bom o suficiente”, “Eu não nasci para ser rico”, “Eu não sou bom com pessoas” e frases como “Pau que nasce torto nunca se endireita” são formas de pensamento que nos congelam, nos aprisionam e nos impedem de pensar adiante. A partir de reconhecer que estes pensamentos fazem parte de seu sistema de crenças, é possível trabalhar para desconstruí-los.

Ao lermos a história bíblica de Jonas, que serviu como simbologia para Maslow cunhar a expressão, aprendemos ainda outra coisa, ao final da história: Um dos fatores que impediu Jonas de cumprir seu destino foi sua própria soberba, seu orgulho de certa forma infantil, de achar que sabia o que era melhor para o povo para o qual deveria pregar. Mais do que o próprio Deus, que lhe pediu a tarefa!

Jonas sabia de sua arrogância, tanto que assume a culpa pela tempestade, e se põe ao sacrifício, uma forma de expiação. Depois, num diálogo com Deus, resmunga sobre o que ele achava que seria certo, e o que acha que está errado, mesmo na atitude de Deus. Que é bastante compassivo e explica, por meio de uma pergunta sutil, se não é Jonas quem está equivocado de se sentir como está.

Quantas vezes isso nos acontece? Em frente ao nosso destino, a nossa tarefa, nós fugimos dela por não a aceitarmos como ela é, como ela se apresenta, mas preferimos fugir para ficarmos agarrados a um ideal do que “deveria” ser o nosso destino. Romantizamos nosso futuro, em devaneios, mas quando o destino realmente nos bate à porta, fugimos como crianças assustadas.

Maslow foi um grande psicólogo americano que durante sua carreira deslocou seu ponto de interesse inicial da Psicologia Experimental, analisando questões de comportamento e a importância da sexualidade no comportamento humano, para a questão da Motivação, estudando as forças que nos impelem ao desenvolvimento. Isso ocorreu após os fatos da 2ª Guerra Mundial, e sua preocupação de que os estudos na área psicanalítica tinham feito pouco para impedir tamanha tragédia. Enquanto presidia a Associação Americana dos Psicólogos, deu o impulso para o desenvolvimento da Psicologia Transpessoal, aliando saberes de campos diferentes e divulgando o trabalho de pesquisadores que não se encaixavam nas áreas mais conhecidas da Psicologia, como a Psicanálise, a Psicologia Comportamental e a Humanista, que ele ajudou a desenvolver.

Referências

http://www.animaestudosjunguianos.com.br/index.php/br/canal-jung/38/o-complexo-de-jonas

https://www.pensarcontemporaneo.com/abraham-maslow-o-complexo-de-jonas-e-o-medo-da-grandeza/

https://www.bibliaonline.com.br/nvi/jn/1

https://pt.wikipedia.org/wiki/Livro_de_Jonas

https://www.ibccoaching.com.br/portal/coaching-e-psicologia/o-que-e-psicologia-positiva/

http://pregacaocrista.com/historia-do-profeta-jonas/

https://paulorogeriodamotta.com.br/complexo-dicionario-junguiano/

Um comentário em “A fuga de nosso destino – O Complexo de Jonas

  1. Adorei o artigo Kiko!!!
    É mto interessante o quanto percebo em atendimento e tbm no meu processo de autoconhecimento o quanto que a resistência a esse fluir da vida vem dessa ilusão da separação, de que somos sozinhos e precisamos desconfiar para nos proteger. Quando tudo que o Universo está pedindo é: confia. E aí isso nos abre pra muito mais. Confiar no saber do corpo, confiar na consciência, confiar nos mistérios inexplicáveis, confiar na vida. Existe essa força sempre nos “puxando” para aquilo de mais harmônico, mais equilibrado. O negócio é que quando a gente ignora ela demais, a pancada vai ficando mais dura kkkkk
    E o site tá lindo! Parabéns 😍🙌
    Abraço

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